The History Of A Crime (Large Print Edition) Book

O crime de que trata esta obra é o golpe de Estado perpetrado por Louis-Napoléon Bonaparte a 2 de Dezembro de 1851, que culminou na derrocada da II República Francesa e, após um plebiscito, na sua proclamação, no ano imediato, como Imperador, sob o nome de Napoleão III.
Não estamos, pois, perante um romance. Ao invés, nesta crónica, escrita na 1ª pessoa, Victor Hugo relata com toda a minúcia os terríveis eventos que se desenrolaram entre os dias 2 e 5 de Dezembro de 1851, nos quais teve relevante intervenção do lado da resistência ao golpe de Estado.
O discurso é directo e objectivo, dando conta das movimentações dos mais diversos intervenientes, bem como da flutuação das expectativas e do pulsar dos estados de espírito. O Autor não o quis conceber, pois, como um relato romanceado - o que não quer dizer que seja ideologicamente neutro e desprovido de uma visão subjectiva, ou sequer que seja literariamente árido -, mas como um texto que se pretende histórico, um testemunho vivo e impressionante.
Mas esta virtude é também, num certo sentido, uma fraqueza do texto. Hugo tem a preocupação de transcrever todos os nomes dos intervenientes (com excepção daqueles que, então ainda vivos, pudessem sofrer represálias durante o Império), as inúmeras deliberações e proclamações que foram sendo feitas, algumas transcrições de sessões da Assembleia Nacional. Para além de muitos desses nomes terem caído no esquecimento, tais menções quebram um pouco o ritmo da leitura e o seu interesse actual, fora do campo historiográfico, é reduzido.
No entanto, no seu cerne a obra continua actual, pois que nos confronta, de forma inescapável, com o eterno problema da luta entre o Direito e a força, de como aquele, desprovido desta, se arrisca a ser pouco mais do que um conjunto de proclamações vazias e inconsequentes, especialmente quando a sociedade não encontra na sua instituição um fundamento legitimador suficiente para assegurar a sua observância.
Particularmente impressionantes são as inúmeras cenas em que oficiais do exército francês e das forças policiais, encarregados de cumprir ordens ilegítimas e ilegais emanadas do poder golpista, são confrontados com essa ilegalidade e com a traição que elas consubstanciam. Mas, embora o reconheçam, a fidelidade às ordens dos seus superiores surge como intocável, mostrando como a obediência absoluta pode converter um corpo de defesa da sociedade numa arma facilmente utilizável contra ele. E, nesta dimensão, a obra transcende claramente a sua occasio histórica.